Título: 30 e poucos anos e uma máquina do tempo
Autor (a): Mo Daviau
Páginas: 304
Editora: Rocco
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Sinopse: Imagine poder viajar no tempo para assistir a qualquer grande show da história: os Beatles no Shea Stadium ou no telhado da Apple Records, o Nirvana em um bar minúsculo de Seattle ou Miles Davis no lendário clube Birdland. A norte-americana Mo Daviau transformou esse desejo em realidade no engenhoso 30 e poucos anos e uma máquina do tempo, uma espécie de cruzamento entre De volta para o futuro e Alta fidelidade protagonizado por Karl e Wayne, dois amigos de meia-idade que descobrem um meio de voltar no tempo para assistir a shows incríveis, e a ganhar dinheiro com o negócio. Tudo vai bem até que Wayne decide o óbvio: interferir no passado. Afinal, quem dispensaria a chance de reescrever uma ou outra linha da própria história? Movido a música e romance, 30 e poucos anos e uma máquina do tempo é uma espirituosa, e um tanto nostálgica, reflexão sobre sonhos, escolhas de vida e a passagem do tempo.
Karl é ex guitarrista de uma banda chamada Axis, que fez sucesso no final dos anos 90, bem quando, no seu auge, os membros da banda tiveram um desentendimento e decidiram seguir caminhos separados. Agora, aos 40 anos, Karl é proprietário de um bar em Chicago e vive com a cabeça no passado: nas bandas de rock antigas, na glória de ter vivido a fase dos 20 e poucos anos durante os anos 90, sem contar que ainda é obcecado por Meredith, sua namorada da época.
Até que um dia, enquanto procura desesperadamente pelo seu velho coturno dentro do armário, Karl é transportado para um show no qual esteve meses antes, e, retorna ao presente após tentar usar o celular. Karl não entende o que houve e conta o que aconteceu ao seu melhor amigo, Wayne, um nerd de computadores. Wayne deduz que se trata de um buraco de minhoca (
"Wayne e eu compartilhávamos daquela aflição comum que assola homens solteiros com perspectivas limitadas e tendências autodestrutivas: víamos nosso passado com tamanho amor e sensação de perda que todo dia à frente era uma facada nas entranhas. Nossos vinte anos tinham sido cheios de rock e coragem. O futuro nos deixou mais velhos, mas nossa sabedoria era duvidosa." Página 9
Karl decide usar o buraco e até ganhar dinheiro com ele, mas estipula algumas regras. Primeiro: somente um grupo seleto de pessoas poderá saber da máquina e pagar para viajar nela. Segundo: a máquina só poderá ser usada para assistir shows de rock antigos, e os viajantes não poderão interagir com o passado e muito menos tentar mudá-lo. Mas, é claro, não demorou muito para que alguém decidisse quebrar as regras.
"Regra número um: o buraco de minhoca só devia ser usado para ir a shows de rock do passado. Isso mantinha a experiência pura e livre da tentação de obter uma vida melhor. Além disso, por que precisaríamos de música se nossa vida fosse exatamente como gostaríamos que fosse?" Página 13
Wayne acha que a máquina poderia ser usada para o bem, e quer voltar ao passado para salvar a vida de um astro do rock, no entanto, depois de um erro de Karl, ele vai parar no ano de 980 em vez de no ano de 1980. Qual o problema? É só trazê-lo de volta, certo? Errado! O aplicativo que Wayne criou para levá-los de volta ao presente depende da energia elétrica do ambiente, e, ops!, não existia energia elétrica em 980.
"[...] Estaríamos obrigados a matar Hitler, libertar os escravos, inverter as eleições de 2000, e socar o saco de cerca de 50 milhões de bullies em escolas primarias. Prefiro limitar minhas obrigações morais a não transar com mulheres casas e doar dinheiro para a Cruz Vermelha. Página 27
Karl sabe que não conseguirá resolver o problema sozinho, e decide procurar ajuda. É quando contrata Lena, uma física com estilo punk e cheia de tatuagens, que pensa estar sendo vítima de uma piada a princípio, mas que depois fica fascinada com o buraco e parece disposta a ajudar a recuperar o Wayne.
Em primeiro lugar devo dizer que o livro não é o que eu esperava quando li a sinopse. Pensei que seria uma leitura leve e despretensiosa com algum toque de reflexão quanto a ficar preso no passado e esquecer-se de viver o presente. Eis o enredo que eu imaginei: até metade do livro os personagens viajam no tempo para assistir shows de rock antigos, se divertem, relembram o passado, até que algo ruim acontece e eles passam a outra metade do livro tentando reverter a situação.
Mas não é isso que acontece. A parte da diversão de assistir aos shows não é retratada, mas sim brevemente relatada no começo do livro e a estória começa de verdade quando Wayne é enviado para o ano errado sem querer. Então o enredo é basicamente uma sucessão de viagens para o passado, mudando fatos importantes da vida dos personagens, - o que, obviamente, gera conseqüências, inclusive o desaparecimento de uma pessoa -, e espiadas ocasionais no futuro.
Agora quem está lendo esta resenha se pergunta: eles estavam mudando o passado e gerando conseqüências indesejadas, certo? Então porque não pararam com isso? Alguns personagens estavam sendo basicamente egoístas. Para que se importar com o que acontece com os outros se a vida deles está melhorando?
"Julgamos demais. Confiamos em uma economia desumanizante. Somos egoístas e não temos ideia de como viver e compartilhar em um coletivo, mesmo enquanto expressamos nosso respeito pela palavra." Página 189
Por falar em personagens, vou escrever um pouco sobre eles agora. Como eu escrevi anteriormente, Karl é um homem de 40 anos que vive obcecado com as glórias de seus vinte e poucos anos vividos na década de 90. Ele ainda é apaixonado por Meredith, sua namorada da época. Só que, no decorrer do livro, ele descobre que ainda é apaixonado por quem? A Meredith da era dos anos 90, e, não por quem ela é agora, e se permite se aproximar cada vez mais de Lena, a física com estilo punk.
"Todo mundo é estranho a seu jeito. Wayne usava casaco de inverno no verão; eu gostava de comer colheradas de maionese salpicada com sal condimentado Lawry’s parado pelado em frente a porta da geladeira. O truque era não assustar os outros." Página 21
Lena não é uma mocinha convencional. Para começar ela tem o que Karl chama de ossos largos, ou seja, é gordinha. Ela tem um estilo punk e um monte de tatuagens pelo corpo. E, apesar de assumir a postura de uma mulher durona, também é atormentada por fantasmas do passado. Ela não teve uma vida fácil, e, por isso, tem que tomar antidepressivos, o que faz com que ela viva como um robô - como ela diz -, justamente porque não consegue sentir as coisas intensamente e fica apática a maior parte do tempo. Mas nem isso impede que fique empolgada com a perspectiva de estudar um buraco de minhoca quando Karl a contrata para salvar Wayne.
"Comecei a entrar em pânico. Estava depositando confiança em uma pessoa porque ela usava uma camiseta do Melvins, porque seu cabelo era azul e porque parecia o tipo de garota que gostaria de uma viagem de volta no tempo para ver uma banda." Página 33
Wayne é um homem rico, que tem um emprego fixo e é extremamente solitário. Para vocês terem uma noção, ele ficou amigo do Karl porque não queria ir embora do bar quando Karl queria fechá-lo e se oferecia para esfregar o chão para poder ficar mais tempo. Ele está totalmente insatisfeito com a carreira e com a vida que leva e Karl é uma espécie de terapeuta para ele.
"Quis dar tapinhas em sua cabeça de forma maternal, mas também queria lhe dar uma porrada e dizer que parasse com aquilo. Eu nunca tivera um amigo como Wayne antes, alguém simpático, doce, superinteligente e em quem eu podia confiar completamente, mas que às vezes era o equivalente de trinta e seis anos de um bebê birrento." Página 25
O romance entre Karl e Lena começa de uma maneira um pouco abrupta, em minha opinião. Ele sente atração por ela desde o começo, mas o que ela sente é uma incógnita na maior parte do tempo. Durante a leitura eu não sabia se torcia para eles ficarem juntos ou se achava que ambos ficariam melhor se cada um seguisse sua vida.
"O cérebro humano, quando exposto a anos de tristeza, nunca compreende nada nem se aperfeiçoa, e viagens no tempo só pioram as coisas." Página 197
O livro foi escrito em primeira pessoa através do ponto de vista do Karl. A narrativa da autora é leve e fluída. Eu só achei o livro um pouco confuso pela sucessão de viagens ao tempo e espiadas no futuro. Como o passado dos personagens mudava, e, isso afetava o presente, as estórias começaram a se sobrepor e, às vezes, eu demorava a pegar o fio da meada de novo.
A edição está linda. A capa super colorida e condizente com o conteúdo. O livro também tem orelhas e conta com um miolo com folhas amareladas e letras e espaçamento com tamanhos ótimos. Não encontrei erros de correção e realmente não tenho o que reclamar em relação à edição.
"Quando eu retorno do passado, sento sozinho com um caderno e escrevo as letras das musicas que acabara de ouvir ao vivo. Letras de música são um tipo especial de poesia que toca direto em sua essência e o ajuda a sentir algo além de tristeza e fracasso." Página 16
Por fim, indico esse livro para quem se interessa por viagens no tempo e gosta de músicas antigas (rock). É um livro um tanto reflexivo, que mostra como cada pequena decisão que tomamos pode afetar nosso futuro. E também nos faz refletir sobre realmente viver o presente. Será que aquela época que achamos que foi a melhor das nossas vidas foi tão boa assim? Será que vale a pena ficar remoendo o passado quando temos uma vida para viver no presente? Resumindo: é um livro muito interessante, que traz uma mensagem importante e que vale a pena ser lido.
Playlist:
Galaxy 500 - Tugboat e Blue Thunder.
Elliott Smith - St. Ides Heaven e Nedle in The Hay
Edward Corey - Doubtful Guest
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